Sei que ultimamente estou com as mãos travadas, escrevendo
Renato Russo em tudo o que é texto. Ele fez parte da minha adolescência, ficava
tardes lendo Machado de Assis e procurando a rádio que passava alguma música da
Legião. Tempo sem internet, e música em MP3, sem tv a cabo, sem livros
digitais. Tempo que só o que nos restava era a rede globo, livros feitos de
papel. Tempo de gravar as músicas que passava na rádio, no toca fitas do seu três em um. Tempo dos vinis, tempo de ficar até tarde na rua, jogando pau no ombro e
correndo pelas avenidas não calçadas das cidades. Não existiam grades nas casas,
nem portões eletrônicos, alarmes e tudo mais, tempo de ser feliz, sem pedir
licença. Pergunte para o seu pai, que
ele lhe explicará melhor.
Esse tempo tenho saudade, porém mais saudade das
músicas que o Renato, Marcelo e o Dado faziam com tanta maestria. Eu sempre
preferi o Renato que o Cazuza, ele foi mais romântico, mais visionário, idiossincrático, sentimentalista, com certeza mais a forma
única de ser Renato. Sua voz foi
a mais bela e, ao mesmo tempo a mais selvagem. Ele foi o nosso porta-voz, da
geração coca-cola. Ensinou um montão de
coisas para aqueles que o seguiam. Hoje, ele ainda nos ensina. Então um dia a
voz calou-se, no entanto deixou um legado muito grande, que nos emociona, e nos
deixa a flor da pele até hoje.
Se você
não tem nem ideia de quem seja a Legião Urbana, pergunte para a sua tia
roqueira, ou, então, procure na internet, pois encontrará um tanto de assuntos,
entrevistas, músicas, vídeos, letras e tudo mais. Só sei que o Renato ensinou-me: "que é preciso amar as
pessoas como se não houvesse amanhã, que, quando o sol bater na janela do seu quarto lembra e vê que o caminho é um só,
que a humanidade é desumana, mas ainda temos chance, o sol nasce para todos,
que são as pequenas coisas que valem mais, que ter bondade é ter coragem," Ele gritou no
auge da sua carreira: "Que país é esse? Que
ainda é cedo, cedo, cedo, que todos os dias quando acordo, não tenho mais o
tempo que passou, mas tenho muito tempo e o mesmo cantou em alto e bom som: que
somos tão jovens!"
O tempo passou, a vida mudou e a geração coca-cola já está
quarentona, mas a vida segue sem a legião, e o que ficou foram os livros, as
músicas cantadas pelos jovens daquela época, cada um seguiu sua vida, e fomos
felizes do nosso jeito. Errando aqui, acertando naquela outra curva, lembrando
das coisas que nos foram ensinadas, não pelos pais, mas como um irmão mais velho,
não dando broncas, entretanto de uma forma que nos apaixonamos: a forma
musical.
Uma coisa tenho certeza: que
sempre seremos a geração coca-cola: não
por querer ser, no entanto por sermos quem fomos um dia. Na verdade, nosso
sentimento foi de imortalidade vivendo em um mundo de trilhas musicais, que
levamos para as nossas vidas, onde a trilha sonora não existe mais a legião,
mas existe algo maior: nosso sentimento por um mundo com mais amor, onde as
pessoas possam viver de forma igualitária. Não nos importando com as
diferenças, e, sim, um país onde cada singularidade seja respeitada. Como diria
Renato: “Tenho saudade de tudo que ainda
não vi.”
Texto publicado originalmente no Jornal: A Novidade em 15/11/2015
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