segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Recomeços



Minha caixa de e-mail estava lotada, propagandas a maioria, alguns leitores, pesquisas sobre deficiência. Estava na hora de uma limpeza geral.  Fui excluindo-os. Quando chego ao final, havia um e-mail que mandei para mim mesma.   Sim, gente, possuo dois endereços. O assunto com letras maiúsculas era tentador, e até um arquivo em anexo possuía. Abri o tal e-mail e, para minha surpresa não havia nada, nenhuma palavra, porém quando abri o arquivo, lá estavam fotos: eu e um ex namorado, duas criaturas sorridentes de olhos brilhantes.  Quase que toquei na tela do computador para tentar alcançar os dois, porém meu corpo foi tomado por uma adrenalina desconhecida. Não sou mais aquela menina da foto guardada em um arquivo. Ela era tão ingênua, tão desprotegida, tão insegura. Mudei tanto, muito mesmo, sem querer fui mudando, e nem percebi o quanto.  Aprendi e mudei muito com a cadeira de rodas, com todos os momentos que vivi. Libertei-me de coisas que não me faziam bem e, hoje talvez eu seja muito mais eu, muito mais feliz.

E, quando a palavra mudança grita, sua área de conforto logo se inquieta. Estamos tão calmos, acostumados com tal situação que - Opa! - isso não pode acontecer comigo. Mas, tem coisas na vida que é preciso e muito. Nem sempre mudar é fácil. As pessoas mudam muito, o tempo todo, nós seres humanos somos metamorfoses, evoluímos a cada dia que passa, e eu espero sinceramente que seja para muito melhor.

Com ela, a mudança, aprendi que a reinvenção da nossa história só depende de nós mesmos, e ter a coragem de dar o primeiro passo. Lamentar faz parte desse processo, pois ninguém é feito de ferro. E você tem duas opções para a sua escolha:  pode ficar lamentando o tempo inteiro, ou seguir em frente e assistir de camarote as opções que o mundo está sempre te oferecendo para ser feliz. 

O ser humano e sua incrível capacidade de tomar decisões e compactuar com suas mudanças. Isso pode acontecer com um corte de cabelo novo, aprender a cozinhar, se matricular em um curso para aprender a tocar um instrumento musical, aprender uma nova língua, fazer algum esporte radical, recomeçar aquela dieta, frequentar a academia e até um curso de fotografia. Mudar é doloroso, entretanto é preciso. Deixar partir faz parte de todo esse processo.

Viver é aprender a conviver com as mudanças que ocorre sem ou com o nosso consentimento, que nos abalam por tempos curtos ou até longos demais. E cabe a nós perceber que depois de todo esse abalo, o fim de um ciclo e o recomeço de outro, da vida, de uma nova história. 
Bem-vindo a vida e todos seus recomeços.

 
  Texto originalmente publicado em 28/08/2015 no Jornal: A Novidade.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

No intervalo




Quando uma criança nasce, seu choro é audível para todos que estão ao aguardo da mesma.  Faz-se o nascimento de mais uma vida. Ela chora com a esperança e a vontade de falar: e o mundo responde com o mesmo entusiasmo do seu choro, quase que desesperado, mas, na verdade é o choro do começo de uma vida. E o mundo grita para a criança: seja bem vinda! 

Entre o nascimento e a morte, o que nos resta é o intervalo. Nesse pequeno espaço é que realmente vivenciamos as descobertas desse fenômeno chamado vida, onde nos questionamos e fizemos essas perguntas existenciais que tentamos responder por toda a nossa existência e quase nunca descobrimos as respostas. De onde viemos? Pra onde vamos? O que viemos fazer aqui?  Temos medo do fim, porém desperdiçar momentos com coisas e pessoas que não nos fazem bem é a maior falta de tempo que podemos tomar da vida. Descobrimos que na adolescência podemos tudo, que somos invencíveis e que a aventura da vida só começou, no entanto a outra metade, lá pelos trinta, quarenta anos também nos traz experiências da aventura de uma vida que é muito melhor quanto nossa falta de experiência da adolescência.



No Intervalo, descobrimos que toda escolha tem suas consequências e que temos que arcar com os resultados.  Descobrimos que a felicidade é uma questão de querer, que precisamos saúde e vamos sentir falta dos joelhos bons quando jovens. Descobrimos que precisamos nos amar primeiro e aceitar os nossos próprios defeitos para então conseguir amar o outro. Descobrimos que vamos sofrer por amor e por pessoas que nos decepcionaram e também vamos decepcionar pessoas, apesar de muita gente não acreditar, ninguém é perfeito e estamos aqui para aprender com os erros.  No intervalo vamos descobrir que as encrencas de verdade são feitas para passar por cada obstáculo colocadas por elas mesmas.
  
Vamos descobrir que qual seja o resultado, sempre queremos levar pra casa um sentimento bom, seja qual for. Que subir na vida de verdade é saltar de para quedas. E que amores de verão também pode ser intenso, ou até virar pra toda a vida.
                                                                     
Estamos sempre em busca de prazeres superficiais, e esquecemos dos prazeres da vida. Como mascar chicletes, assistir ao um pôr do sol, fazer um piquenique, ir ao um show, beijar ou até encontrar um amigo dos tempos da escola e ficar de papo pro ar. Leia mais, sempre tenha um livro pequeno dentro da bolsa, assista todos os filmes clichês, e escute sua música preferida. Decore seu poema predileto e recite-o para alguém em especial. Tenha um álbum de fotografias com os momentos especiais.  

Aproveite o intervalo e não tenha medo, tenha coragem de fazer coisas e até sentir mais do que você poderá lembrar um dia. Tome cálcio, aprenda a tocar um instrumento, escreva em um diário, e também declare seu amor, não tenha vergonha.  Uma vez ou outra decida perder um pouco de tempo. Diga mais “Bom dia”, “Por favor”, “Desculpe” e “Obrigada”. No fim da vida, você esquecerá todos seus erros, mas se arrependerá do que não ousou fazer. Ouse muito. Tenha fé e morda a vida com vontade. Não deixe o melhor para depois, a vida é curta demais e nunca se sabe quando chegará o final. 

Texto publicado originalmente no Jornal A Novidade em 21/08/2015

sábado, 15 de agosto de 2015

Agora eu escrevo

Sabe, pra falar a verdade já vivi muitas experiências de andante para cadeirante, nas entrelinhas dessas duas palavras também fui aparelhante e depois muletante. Escolhi cores para minha vida, nada de preto e branco, nada de fotos amareladas com o tempo. Eu vivi e vivo até hoje experiências incríveis, e até sou quase uma escritora.




É, vivo e sempre sigo para a frente impulsionando as minhas rodas, que já foram vermelhas e agora escolhi uma cor mais adulta, é, eu cresci ouvindo as pessoas falarem que eu não podia isso ou aquilo. E as palavras se repetiam na minha memória errante. Tadinha, coitada, doente, não pode nada.

Mas eu cresci de um modo desesperado, cresci e não sou mais aquela que um dia fui. Eu sou sim uma cadeirante e ainda tenho alguns medos, anseios, tristezas e alegrias, oscilações de humores, mais eu sou e sempre serei eu. Louca, maluca, doida, em morder a vida de um jeito quase que aflito.

Eu quero, sim quero é o meu verbo preferido ultimamente. Quero rodar mais, que os pneus não fiquem carecas tão rapidamente. Quero ter menos medo e mais coragem de enfrentar tantos desafios que aparecem na minha frente. Sei que preciso de muitas palavras como persistência. A vida nos mostra como somos capazes de enfrentar tantos momentos.

Não acreditava muito no meu potencial e de tanto colocar os meus momentos aqui, fui descoberta, sim eu escrevo pra você aí, e também escrevo pra nossa gente aqui. Escrevo para o senhor que está na beira da praia, escrevo para o jovem que sempre passa de bicicleta, escrevo para a dona de casa, e também escrevo para os companheiros de vida, de vida de rodas e suas dificuldades persistentes, entretanto com maestria modificam as dificuldades em facilidades para viver. Escrevo para a criança que está aprendendo a ler, escrevo para os que estão tomando o seu café. De cadeirante virei a escrever, virei algo que eu nunca imaginei na minha vida. Há cinco anos sou cadeirante e há cinco anos atropelo as palavras que passam pela caixa preta da minha memória.

Eu só quero uma coisa, ser a "escrevinte" de uma vida com mais brilho, ser mais vívida  nesse mundo. Que a crise vire crie. Crie arte, música, crie um planejamento, crie algo que te faça sorrir mais ainda.  E nesses cinco anos cresci e criei uma vida totalmente diferente. Crie, seja o autor da sua vida e que nada faça você desistir daquilo que realmente você goste de verdade.

Agora eu escrevo não só para mim, escrevo para você também!

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Apaixone-se pelo incerto



Picasso descobriu sua paixão pela pintura aos oito anos de idade, Einstein também descobriu seu amor pela física cedo. Eles sim são pessoas sortudas diria, desde cedo seu trabalho que não é trabalho virou uma paixão absurdamente necessária em suas vidas. 

Fotografia do meu arquivo pessoal



Depois que o segundo grau acaba, nós, mortais nem físicos e pintores ficamos em um dilema. O que vou fazer? Que carreira tomar? Que faculdade fazer? Será que vai dar certo? Milhões de perguntas que torram os neurônios do nosso cérebro. Insegurança, medo e ansiedade, tudo isso combinados com a nossa falta de experiência diante de tantas responsabilidades que um dia teremos. Só queremos um trabalho que garanta nosso sustento e um pouco de tranquilidade na vida, algo que nos faça feliz, realizados como pessoas e profissionais. Mas posso lhe dizer que se você é um quarentão e ainda não descobriu sua paixão de verdade. Relaxa. Os quarentões mais interessantes são aqueles que não sabem o que fazer da vida.

A gente cresce, e o mundo está sempre nos cobrando. Somos jogados como um cometa em um planeta desconhecido e sem saber o que fazer. O que nos resta? Um trabalho razoável, casar, ter uma família, ter filhos. Pronto! Se você não está dentro desses padrões, a sociedade te cobra o tempo todo e a rotação do mundo não para e as cobranças estão de mãos dadas com ela. Se é um lunático que deixou casa e viaja pelo mundo é taxado de doido, maluco e que seus pensamentos voam para a lua. Sua vida tem que estar relacionada a paixões e principalmente ter algum sentido, ninguém consegue viver na monotonia. 

Eu, por exemplo, descobri que escrever talvez seja uma das minhas paixões, mesmo que eu erre, volte atrás, corrija e tudo mais. A insegurança de um mundo novo faz parte da descoberta do que você gosta e nunca se imaginou fazendo. Descobri isso aos vinte nove anos, me arrisquei, tive medo, porém enfrentei cada desafio dado e relacionado a escrever. Errei muito, confesso e ainda erro, sou muito autocritica, porém aprendi que cada pessoa escreve de um jeito diferente, cada um pensa de uma maneira particular e tive muita dificuldade de passar minhas ideias para o papel. 

Talvez, você não concorde com nada que eu escreva, todos nós somos escritores da vida, entretanto alguns passam para o papel com mais beleza e plenitude, outros não.  Se existisse uma máquina para ler meus pensamentos e os textos que surgem de madrugada ou quando lavo a louça do café. Bom, você seria surpreendido com as minhas paixões mal sucedidas e a loucura dessa vida.

Tente procurar algo que de sentido a sua vida, que te faça feliz, de verdade. Não seja hipócrita, nem leviano, apenas siga. Às vezes somos condenados a fazer coisas tão mecanicamente que esquecemos dos nossos sonhos, das nossas vontades.  Se liberte por paixões avassaladoras e não tenha medo de futuros incertos. Nada dura para sempre e consequentemente você sempre procura o caminho mais certo, sem elevações e obstáculos. E quase sempre o caminho mais difícil te leva a um lugar que não é seguro, porém somos covardes do incerto. É o incerto que nos leva a nos apaixonar pela vida. 

 Publicado originalmente no Jornal A Novidade em 07/08/2015


sábado, 1 de agosto de 2015

Em férias




Quando entrei naquele parque minha visão teve quase um colapso de tanta criança junta em um mesmo espaço. Uma segunda- feira nublada do mês de julho e elas estavam lá, de todas as cores, classes sociais e de todos os jeitos imagináveis possíveis, juntas elas só querem uma coisa, apenas ser crianças. Havia no balanço duas meninas que se balançavam e sorriam uma para a outra. Seus vestidos coloridos voavam enquanto o balanço subia. As risadas se misturavam com as conversas de ser criança. Havia uma menina com sua cachorrinha poodle, as duas sentadas em um banco, a menininha passava as mãos carinhosamente no pelo plumoso e volumoso da cachorrinha, enquanto seu olhar passava por outras crianças que ali se divertiam. No gramado os meninos jogavam bola com sua bola de futebol multicolorida, jogavam um para o outro e também corriam, dando risadas, parando a bola com seus pés ainda pequenos, porém habilidosos. 

Férias, quantos dias imagináveis eles esperaram por isso, crianças querendo se divertir, com seus primeiros e confiáveis amigos, amigos do colégio, conversas sobre seus jogadores de futebol preferido, seu time, ou até de como conseguir manobrar um skate. Eles estão ali e já imaginando o que podem fazer amanhã, dormir até tarde, talvez? Sem deveres para casa, sem cálculos matemáticos, nem as explicações sobre as expedições na aula de história, sem recreio, educação física, sem rever toda a turma e talvez até sentirá uma ponta de saudade da professora que tenta explicar sobre uma disciplina chatíssima, entretanto ela se esforça em passar a matéria da melhor forma possível para seus alunos. 

Crianças que agora podem dormir tarde, talvez até na casa do amigo, aquele amigo camarada que todo mundo tem. Comer pipoca, chocolate, assistir desenho até tarde, rir até a barriga doer, brincar de lego e construir seus heróis preferidos, casas, hotéis, tudo o que se pode imaginar. Lutas com dinossauros, soldados e tudo mais, só uma ressalva, são apenas crianças, sem preocupações aparentes, só tentando imaginar seu mundo, construindo o que um dia elas serão de verdade. 

E os pais onde ficam nessas férias? Alguns trabalham, outros não, entretanto há uma coisa que diferencia a educação de nossas crianças, sei que às vezes o trabalho toma muito seu tempo, sei que às vezes a noite já está caindo e o tempo parece que se derrete em suas mãos e você já nem sabe se seu filho dorme, ou ainda está acordado. Tempo, tempo, tempo, você vai sentir falta de quando ele, seu filho era apenas criança e mal pronunciava as palavras e você tentava de todas as maneiras decifrar o que estava tentando falar. Guarde um tempo para seu filho, nem que seja para conversar ou ler um livro para o mesmo dormir e se as férias de vocês coincidirem, aproveite cada tempo, espaço e conversa, pois um dia você irá olhar para trás e sentir falta de qualquer vestígio que sobre entre vocês como se agarrasse a última gota de suor de seu trabalho para dar um futuro melhor. Há momentos na vida que nenhuma “coisa” paga. 

Aproveite, e esteja em férias mas não do seu filho, esteja em férias às vezes, quando puder, do tempo, mas do tempo que você vai poder lembrar que esteve presente na vida da sua criança. Ele é só uma criança e quer com certeza a sua presença no tempo de ser criança. 

Publicado originalmente no Jornal A Novidade em  31/07/2015